terça-feira, 1 de março de 2011

Paroquialismos na Geração à Rasca

A nossa geração está à rasca. Este é um facto inegável e inexorável, que permeia o nosso quotidiano e premeia os nossos esforços -- académicos e profissionais. E em boa hora alguém se lembrou de organizar um protesto que visa contestar os males mais salientes e epidémicos. Vale a pena lembrar que este protesto não foi organizado pela oligarquia dos partidos e seus sindicatos -- este é um protesto que tem origem no grassroots. Sem vanguardas e sem líderes que tomam entre as suas mãos ungidas a tarefa histórica e impreterível de liderar o povo rumo a [insira aqui a sua teoria sobre o Fim da História].

Insurgem-se contra este protesto os arautos da inevitabilidade e do desenrasca, da imobilidade social e do "podia ser pior". Mas como sabemos, é bastante provável que de um pasquim apenas sejam debitadas opiniões cujos padrões de análise são francamente baixos. Perdoem-me o ad hominem, mas há casos em que a logorreia é auto-evidente. A teoria da escassez de fadas madrinhas para um número significativo de Cinderelas é pouco plausível.

Existem críticas que devem ser tecidas a este protesto:

1. Paroquialismo. Este é um protesto que ignora o facto de estarmos à rasca desde que existe acumulação primitiva de Capital. O pecado original da economia (nas palavras de Marx) criou uma sociedade cujo dínamo é a classe, e em que a história progride através de todo um sistema de contradições. A nossa condição é "rasca" a partir do momento em que somos explorados: este protesto reivindica apenas melhores condições de exploração.

Devemos almejar à emancipação por oposição à concessão.

2. Inconsequência. Este protesto acaba por encaixar na tipologia dos "passeios do descontentamento". E a classe dominante sabe lidar com mestria doutoral com esse tipo de marchas -- com a condescendência da alienação política e em última instância, panem et circenses e algumas concessões.

Diferindo das procissões quasi-religiosas organizadas pelo clero sindical, tem em comum com estas a inconsequência. A Avenida da Liberdade não será uma Praça Tahrir - o povo é sereno.

Mas a crítica é vã quando não se esboçam alternativas. O momento é crítico e deve ser aproveitado. Quando a máquina se move, ainda que mal oleada e desconexa, há que maximizar a eficiência -- menos desperdício de energia no sistema, mais trabalho realizado. Se a "geração à rasca" vai sair à rua, fá-lo-á inconscientemente e mediante identificação com instâncias particulares. Aproveitemos o protesto para consciencializar, e para demonstrar uma realidade superveniente - a da "Classe à Rasca".

É hora de redigirmos e imprimirmos panfletos, promover a discussão informada sobre ideias relevantes e levar o protesto para lá da individualidade.

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